A Constituição Federal, quanto aos direitos e deveres individuais e coletivos, preceitua em seu art. 5º, caput, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
Em relação ao prescrito pelo referido artigo, o seu inc. I, define que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.
Já, relativamente aos direitos sociais, a Constituição Federal dispõe no caput do art. 7º e em seus incisos XXX e XXXII, in verbis:
“São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;
XXXII – proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos;”
A Consolidação das Leis do Trabalho, por sua vez, no art. 5º, preceitua que a todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual, sem distinção de sexo. E, posteriormente, no art. 461, que sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.
A partir dos dispositivos constitucionais e legais supracitadas, tem-se os requisitos legais para a equiparação salarial de empregados que, se preenchidos, justificam, por conseguinte, no direito daquele empregado que sofre a discriminação salarial ao recebimento das diferenças salarias identificadas em razão da comparação do seu salário com o indivíduo que percebe maior remuneração, denominado paradigma.
Tais requisitos, portanto, são: identidade de função exercida, identidade de empregador, identidade de localidade de exercício das funções e simultaneidade nesse exercício.
A identidade de função exercida decorre do fato de ser realizado, pelo indivíduo discriminado e seu paradigma, o mesmo trabalho, englobando atribuições, poderes e práticas de atos materiais concretos.
Quanto a identidade de localidade, o Tribunal Superior do Trabalho, por meio da Súmula nº 6, definiu que o trabalho não necessita ser realizado no mesmo local físico, ao dispor que, in verbis:
“O conceito de “mesma localidade” de que trata o art. 461 da CLT refere-se, em princípio, ao mesmo município, ou a municípios distintos que, comprovadamente, pertençam à mesma região metropolitana.”
Por último, a simultaneidade no exercício funcional é um requisito também exigido pela atual Súmula 6, IV, do Tribunal Superior do Trabalho, que corresponde à coincidência temporal no exercício das mesmas funções, em caráter permanente, ou seja, não eventual, superior a 30 (trinta) dias.
Desta forma, preenchidos tais requisitos, o empregado que percebe menor remuneração terá direito à equiparação salarial e, por conseguinte, as diferenças salariais decorrentes.
No entanto, existem, ainda, fatos modificativos, impeditivos e extintivos que eventualmente poderiam inviabilizar a equiparação salarial, quando ocorrer entre os empregados diferenças de perfeição técnica na realização do trabalho, de produtividade e de tempo de serviço na função superior a 02 (dois) anos.
Além disso, também inviabiliza a equiparação salarial o fato de o empregador possuir quadro de carreira prevendo promoções alternadas por merecimento e antiguidade, instituído na forma da Lei, ou, ainda, o fato de que o paradigma indicado ocupe a função enfocada pela equiparação em decorrência de readaptação previdenciária por “deficiência física ou mental”.
Oportunamente, cumpre destacar ser possível a equiparação salarial entre empregados que exercem funções intelectuais, merecendo, neste caso, ser destacado o trecho da lição de Gustavo Filipe Barbosa Garcia, in “Diversidade de disciplinas não justifica diferença salarial de professores”, in verbis:
“Questão difícil refere-se à equiparação salarial entre empregados que exercem funções intelectuais. Como a lei não veda a equiparação nesse caso, o TST adotou o seguinte entendimento na Súmula 6, inciso VII:
“Desde que atendidos os requisitos do art. 461 da CLT, é possível a equiparação salarial de trabalho intelectual, que pode ser avaliado por sua perfeição técnica, cuja aferição terá critérios objetivos”.
Mesmo assim, há evidente dificuldade em saber quais podem ser efetivamente os mencionados “critérios objetivos”, tornando a prova da identidade de funções certamente mais difícil no caso de trabalho intelectual.
Cabe fazer menção à hipótese de equiparação salarial entre empregados que exerçam a mesma função de professor, do mesmo nível, ainda que lecionem disciplinas ou matérias diversas, uma vez presentes os requisitos para a equiparação.
Apreciando caso envolvendo essa interessante questão, com fundamento no princípio da não discriminação, assim decidiu o Tribunal Superior do Trabalho:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EQUIPARAÇÃO SALARIAL ENTRE PROFESSORES DE NÍVEL MÉDIO QUE LECIONAM MATÉRIAS DISTINTAS. Tendo o agravo de instrumento logrado demonstrar que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, quanto ao tema relativo à equiparação salarial, ante a constatação de violação dos arts. 5º, caput e I, e 7.º, XXX e XXXII, da CF, merece provimento. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. EQUIPARAÇÃO SALARIAL ENTRE PROFESSORES DE NÍVEL MÉDIO QUE LECIONAM MATÉRIAS DISTINTAS. DISCRIMINAÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL. Configura manifesta discriminação, não tolerada pela ordem jurídica, inclusive constitucional, tratamento remuneratório diferenciado em vista de fator injustamente desqualificante, tal como a mera circunstância de os professores de ensino médio lecionarem matérias distintas. Violação direta e frontal dos arts. 5º, caput e I, e 7º, XXX e XXXII, da CF. Recurso de revista parcialmente provido.” (TST, 6ª T., RR-95.049/2003-900-01-00.1, Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, DJ 20.06.2008).”
Ao final, referido doutrinador conclui da seguinte forma o assunto sob análise, in verbis:
“Na realidade, defende-se o entendimento de que a simples diversidade de disciplinas ministradas não caracteriza, por si, fundamento para se afastar o direito à equiparação salarial, justamente porque, em termos objetivos, a identidade de funções está presente.
Autorizar o pagamento de salário diferenciado entre professores de mesmo curso, apenas em razão da diversidade de disciplinas lecionadas, pode significar discriminação entre empregados que se encontram na mesma situação de fato, especificamente para fins remuneratórios, não havendo diversidade lógica ou razoável que autorize o tratamento desigual.
Por ser a igualdade um direito de ordem fundamental, integrando os direitos humanos de segunda dimensão, e por ser o direito à equiparação salarial uma concretização da igualdade na esfera dos direitos sociais (no caso, trabalhistas), conclui-se que a equiparação salarial representa uma aplicação dos direitos humanos fundamentais no plano da relação jurídica de emprego.” (negrito nosso)
Conclui-se, portanto, que o direito nacional veda a discriminação de forma ampla e, neste pequeno artigo, de forma despretensiosa, apontamos àquela relativa a discriminação salarial, que justifica o direito do empregado ao recebimento, do empregador, das diferenças salariais devidas, acrescidas dos reflexos relativos aos descansos semanais remunerados, às horas extras, às férias, e ao seu terço constitucional, aos décimos-terceiros salários, ao FGTS e às participações nos lucros e resultados.
Demétrio Irineu Grizotto